No dia 9 de agosto de 2013, ocorreu a cerimônia de lançamento do site do Brasil Nunca Mais Digit@l, site que reúne cerca de 900 mil páginas digitalizadas de um conjunto de 710 processos da repressão julgados pelo Superior Tribunal Militar (STM), além de fotos, vídeos e outros materiais que retratam os abusos cometidos durante a ditadura militar, bem como a resistência de parcela da sociedade civil ao regime de exceção. O site está hospedado no endereço http://bnmdigital.mpf.mp.br/.

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O ato teve início às 10 horas. Foi apresentado ao público o histórico do projeto, o conteúdo e o funcionamento do Brasil Nunca Mais Digit@l. Além do lançamento do site, foram prestadas homenagens aos idealizadores do projeto original do Brasil Nunca Mais (BNM), realizado no início dos anos 80 pela Arquidiocese de São Paulo e pelo Conselho Mundial de Igrejas, e aos realizadores do projeto de repatriação e digitalização do acervo que fora preservado na Suíça e nos EUA.

O BNM foi integralmente desenvolvido nos anos oitenta sob a coordenação de Dom Paulo Evaristo Arns e do Reverendo James Wright, com apoio financeiro do Conselho Mundial de Igrejas. Em 15 de julho de 1985, apenas quatro meses após a retomada do regime democrático, deu origem ao livro "Brasil: Nunca Mais", publicado pela Editora Vozes, que se tornou um sucesso de vendas e referência no tema da violação aos direitos humanos no Brasil.

O acervo do BNM é composto essencialmente de cópias dos processos judiciais que tramitaram no Superior Tribunal Militar, movidos contra presos políticos. Os advogados de defesa perceberam que poderiam reproduzir esses autos, aproveitando-se do prazo de 24 horas de que dispunham para examiná-los fora do STM. Com essa estratégia foram obtidas cópias integrais dos processos e especialmente dos depoimentos prestados pelos presos perante as auditorias militares, nos quais denunciavam as torturas e outros detalhes das violências sofridas, inclusive nomes de perpetradores.

Foram copiados 710 processos em Brasília e, após o material ter sido remetido a São Paulo, uma equipe de advogados, jornalistas, arquivistas e historiadores o examinou e sistematizou. Finalmente, foi escrito um relatório de doze volumes e o livro editado pela Vozes. Diante do temor de apreensão e destruição do material, foi decidido microfilmar todas as páginas produzidas e remeter os filmes ao exterior. Esse trabalho foi empreendido ao longo de seis anos, sob total sigilo. Participaram do BNM, dentre muitos anônimos: Frei Betto, Ricardo Kotscho, Paulo Vannuchi, Sigmaringa Seixas, Luiz Eduardo Greenhalgh, Eny Raimundo Moreira e Charles Harper.

A cerimônia de lançamento -- A cerimônia de lançamento do site Brasil Nunca Mais Digit@l teve início com a mesa de abertura, composta pelo procurador federal dos direitos do cidadão Aurélio Veiga Rios, pela coordenadora da Comissão Nacional da Verdade, Rosa Maria Cardoso da Cunha, pelo senador Aloysio Nunes Ferreira, pela deputada federal Luiza Erundina e pelo presidente da Comissão Nacional de Anistia, Paulo Abraão. Antes que a palavra fosse passada à mesa, o procurador regional da República Marlon Alberto Weichert e o idealizador do Armazém da Memória Marcelo Zelic, coordenadores do projeto, falaram um pouco da história do projeto Brasil Nunca Mais original, e dos objetivos do Brasil Nunca Mais Digit@l.

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Marlon Weichert ressaltou que o momento era de celebração e de homenagens, mas também de autocrítica, uma vez que é necessário se perguntar o porquê da sociedade brasileira aceitar um regime de exceção, bem como de manter impunes os perpetradores dos crimes cometidos durante a ditadura. O procurador ressaltou que foi realizado o vaticínio que consta na apresentação do Brasil: Nunca Mais, que conclama que ninguém termine a leitura do livro sem se comprometer, em juramento sagrado com a própria consciência, a engajar-se numa luta sem tréguas para eliminar do seio da humanidade o flagelo das torturas, de qualquer tipo. "Afirmo por mim, e pela mais de uma centena de colaboradores que participaram do BNM Digital: nós fizemos esse trabalho porque assumimos esse compromisso", concluiu, emocionado. Marcelo Zelic, por sua vez, falou sobre os objetivos do projeto e lembrou que o Brasil ainda não cumpriu a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que condenou os crimes cometidos pelos agentes do Estado durante a Guerrilha do Araguaia, lembrando que práticas autoritárias ainda nos dias de hoje são perpetradas pelo Estado brasileiro.

A segunda mesa do evento foi dedicada ao projeto original do Brasil: Nunca Mais. Ela foi composta por Frei Betto, coordenador do livro Brasil: Nunca Mais, pela ex-presa política durante o regime militar Guiomar Lopes, pelo moderador do Conselho Mundial de Igrejas Walter Altmann e pelo cardeal da Arquidiocese de São Paulo Dom Odilo Scherer.

Na sequência, foram homenageados alguns dos participantes do projeto original, presentes no ato de lançamento do Brasil Nunca Mais Digit@l e, por fim, foi feita a apresentação e o lançamento formal do site.

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BNM Digit@l -- A digitalização e divulgação do acervo do BNM objetiva preservar esse patrimônio histórico nacional, ampliar o acesso ao material de pesquisa e revelar a história de concepção e

desenvolvimento dessa iniciativa social. O trabalho foi iniciado em 14 de junho de 2011, quando o Ministério Público Federal repatriou do "Center for Research Libraries" (CRL), nos EUA, os microfilmes de segurança que continham cópia de todos os processos judiciais reproduzidos pelo BNM e o Procurador-Geral da República recebeu do Secretário Geral do Conselho Mundial de Igrejas os arquivos daquela entidade sobre o projeto.

O BNM Digit@l é uma parceria de diversas entidades comprometidas com a promoção dos direitos humanos: Ministério Público Federal, Armazém Memória, Arquivo Público do Estado de São Paulo, Instituto de Políticas Relacionais, Conselho Mundial de Igrejas, Comissão Nacional da Verdade, Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional Rio de Janeiro, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Universidade de Campinas (Arquivo Edgard Leuenroth), Universidade Metodista de São Paulo, Center for Research Libraries, Arquivo Nacional e Rubens Naves, Santos Jr., Hesketh Escritórios Associados de Advocacia. O projeto também recebeu apoio do Superior Tribunal Militar e do Consulado Brasileiro em Chicago.